segunda-feira, outubro 13, 2008

PENSAMENTO_Pedro Teixeira Neves_Sobre a imprensa cultural em Portugal


A partir de hoje a Quarta Parede promove neste espaço um conjunto de reflexões sobre a imprensa cultural em Portugal.

A primeira colaboração cabe a Pedro Teixeira Neves, jornalista e escritor, que aqui deixa uma preciosa análise da actual situação da imprensa cultural em Portugal. Um texto para ler e saborear.


Era no tempo do papel

texto de Pedro Teixeira Neves

Pede-me voz amiga que entretenha um texto sobre o desaparecimento em Portugal dos espaços de imprensa escrita reservados à divulgação cultural. Mas, ainda há Imprensa escrita?... Sim, eu sei, brinco. Há, ainda há. Não será a mesma de há uma dezena de anos, mas ainda há. Resiste. Resiste? Quem resiste? Quem em que Imprensa escrita resiste? E como é essa Imprensa escrita que ainda resiste? Melhor: resiste nela espaço para a divulgação cultural? Não, não vou sequer aos quiosques confirmar. Não resiste. Façamos o ponto, assim de cabeça, começando pelos diários: «Público», «Diário de Notícias», «Jornal de Notícias», «24 Horas», «Capital»... Há mais? Se há, escapam-me. Nos semanários: «Expresso», «Sol», «Semanário». Aos detalhes, pelos ditos ‘de referência’: o «Diário de Notícias», que outrora teve bons suplementos de cultura, que outrora fez acontecer um milagre chamado «DN Jovem», deixou-se dessas aventuras «culturalmente altruístas», e, nessa matéria, já quase nada tem a oferecer, excepto as duas ou três páginas diárias com que vai tratando e arrumando as ‘novas’ da Cultura. Quanto ao «Público», que em tempos teve um estimável «Mil Folhas» escuda-se agora, diariamente, num caderno dito «P2» onde vai inventando umas matérias de sabor mais ou menos cultural. À sexta, no «Y», sempre há um pouco mais de sumo, mas o maior destaque editorial recai quase sempre sobre a música e o cinema. No que aos outros títulos respeita, as artes e os espectáculos resumem-se ao bê-á-bá do que vai acontecendo, com notícias de mil caracteres escritas quase em cima do joelho, sem qualquer profundidade ou contextualização histórica, sem debate, sem confronto de ideias. Vou mais longe e assumo: ou há concerto da Madonna e o editor ou o director da publicação querem lá estar e levar as famílias, e para conseguirem os bilhetes de graça conferem à coisa espaço editorial, ou então venham as notícias do crime, as últimas dos pais da Maddie ou as mariquices desencabrestadas dos «socialites» tipo aquela senhora das mil e uma cirurgias plásticas, que mais parece um tupper ware a rir, ou de um tal Castelo Branco inenarrável.
E nos semanários? Muda o panorama? Nem tanto. No porta-aviões «Expresso» a linha editorial é, no essencial, a de sempre. Um caderno especial com os destaques da agenda cultural repartidos por áreas. Nada de mal vem daí ao mundo, antes pelo contrário, preze-se a cristalinidade da linha editorial. Um senão, as vozes de sempre a assinarem os textos. E um volume de páginas cada vez menor, como também a cada vez menor qualidade do papel onde se faz imprimir. O «Sol»? O «Sol» não tem Cultura, ponto. Devia, ponto. Mas não tem, ponto. O «Semanário»? Como diz? O jornal das tias e do tipo que ficou a dever um dinheirão aos jornalistas que ali trabalhavam em 1998? O pasquim das universidades e seus apaziguados? É preciso dizer mais? Pois bem, o recorte da Imprensa escrita cultural está traçado. Está? Minto. Falta falar do «Jornal de Letras». Eu gosto. Já gostei mais, é certo. Mas fala de artes e de cultura e eu gosto que se fale das artes e da cultura. Gosto, pois, do «Jornal de Letras», gosto até de ir ouvindo, ao longo dos anos, de que aquilo é a mesma coisa de sempre, que pagam mal e a más horas, que é um jornal de amigos do José Carlos Vasconcelos, que isto e aquilo e que, tarde ou cedo (sempre mais cedo), vai acabar. Numa palavra: um resistente. E aos resistentes nós chamamos bravos. Um resistente a que, no meu entender, falta a pluralidade de abordagens, sobretudo vinda de sangue novo na escrita. Tal como lhe falta arrojo gráfico. Adiante. Noutro campo temos as revistas. Uma «Visão», uma «Focus» e outras «residuais». O photomaton não muda. A Cultura é o parente pobre do tratamento editorial. Não há escapatória, ou então obtenha-se o patrocínio de um Casino para fazer um produto como a «Egoísta», ou então imprima-se uma revista de livros para o grupo Bertelsmann e, em ambos os casos, prescinda-se da publicidade. (...)

Carregue aqui para ler na íntegra o texto de Pedro Teixeira Neves. Disponível para leitura online ou descarga em formato PDF.


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